domingo, 27 de fevereiro de 2011

Culpa

Confesso que foi com "culpa" que recebi a notícia do falecimento de Moacyr Scliar, via tuitada do @FredPerillo. Digo que foi com "culpa" por não conhecer a vasta obra dele, que escreveu desde ficção infantojuvenil (certamente, alguma Professora do 1o grau do Colégio Marista Conceição - onde estudei -mandou ler algum livro dele, mas nessa época eu não era "antenado" ainda, e somente a partir do 1o ano do 2o grau é que me tornei "gente"), crônicas, contos, romances e até ensaios. Com "culpa" porque além de ler semanalmente sua coluna no jornal Zero Hora, li apenas dois ensaios dele (magníficos, diga-se de passagem): "Do Mágico ao Social" e "Enigmas da Culpa".
O primeiro li por indicação do Germano. Esse livro sempre rolava de lá pra cá no escritório, passando por todos os orientandos dele, até que um dia resolvi lê-lo. E como trabalhava (na época) com Direito à Saúde, tanto no escritório quanto no Grupo de Pesquisa de "Filosofia do Direito e Teoria dos Sistemas" da Faculdade de Direito da UPF, li o livro que relata a trajetória da saúde pública no Brasil. O (des)encanto da saúde pública está sugestionado a partir do próprio título. Já o segundo, li por indicação da Renata. Lembro que ela leu num verão e falou muito desse livro depois. Passou o tempo, e num amigo-secreto de natal em Uruguaiana/RS, indiquei o livro como uma das possibilidades de presente. Eis que ganhei dois exemplares do livro nesse natal! Um do amigo-secreto e outro de alguém que pegou a dica na lista para me presentear. Assim tive a oportunidade de ler o livro. E desde que o li, sempre o recomendo e uso até em sala de aula, principalmente nas aulas de Criminologia e Direito Penal I. Mas além de usar essa obra na sala, a uso para a vida. Para buscar entender esse fardo de culpa que sempre carregamos, por aquilo que fizemos, por aquilo que não fizemos e por aquilo que deixaremos de fazer. E isso porque a culpa é inerente à complexidade humana. E o Moacyr detalhou a complexidade da culpa desde pensamentos e lembranças de sua infâcia no bairro judeu de Porto Alegre/RS (Bom Fim).
O chamei de Moacyr no parágrafo anterior como se fosse íntimo dele. Mas na verdade não sou. Entretanto, certa feita, quando eu e o Paulinho e nossas respectivas namoradas da época passávamos um belo final de semana na serra gaúcha, na cidade de Gramado precisamente, lembro que no sábado à noite antes de comer o tradicional "fondue" e degustar uns vinhos, fomos ao Cinema de Gramado. Ao término do filme, descendo as escadarias do Cinema, encontramos o Moacyr Scliar. Nesse momento, sempre surge uma hesitação em não saber como agir, pois encontramos alguém famoso. Apenas um aceno e um "ôpa" ou um "boa noite", também não lembro pois já faz um tempo isso. Enfim, após ver em carne e osso o escritor, e conhecer a obra (ainda que parte pequena dela), acredito que nos tornamos "íntimos" pelos pensamentos expostos por ele e pela confluência dos meus pensamentos a partir do que li dele.
Buscarei conhecer mais sua obra, pois a imortalidade dele não está apenas no reconhecimento da Academica Brasileira de Letras, mas em cada página escrita e presenteada aos seus leitores.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Anotações insensatas


Mas não se pode agir assim, a amiga avisou no telefone. Uma pessoa não é um doce que você enjoa, empurra o prato, não quero mais. Tentaria, então, com toda a delicadeza possível, sem decidir propriamente decidiu no meio da tarde — uma tarde morna demais, preguiçosa demais para conter esse verbo veemente: decidir. Como ia dizendo, no meio da tarde lenta demais, escolheu que — se viesse alguma sofreguidão na garganta, e veio — diria qualquer coisa como olha, tenho medo do normal, baby.

Só que, como de hábito, na cabeça (como que separada do mundo, movida por interiores taquicardias, adrenalinas, metabolismos) se passava uma coisa, e naquele ponto em que isso cruzava com o de fora, esse lugar onde habitamos outros, começava a região do incompreensível: Lá, onde qualquer delicadeza premeditada poderia soar estúpida como um seco: não. E soou, em plena mesa posta.

Tanto pasmo, depois. Sozinho no apartamento, domingo à noite. Todas as coisas quietas e limpas, o perfume adocicado das madressilvas roubadas e o bolo de chocolate intocado no refrigerador — até a televisão falar da explosão nuclear subterrânea. Então a suspeita bruta: não suportamos aquilo ou aqueles que poderiam nos tornar mais felizes e menos sós. Afirmou, depois acendeu o cigarro, reformulou, repetiu, acrescentou esta interrogação: não suportamos mesmo aquilo ou aqueles que poderiam nos tornar mais felizes e menos sós? Não, não suportamos essa doçura.

[...]

Caio Fernando Abreu

domingo, 20 de fevereiro de 2011

al lado del camino




Me gusta estar a un lado del camino
fumando el humo mientras todo pasa
me gusta abrir los ojos y estar vivo
tener que vérmelas con la resaca
entonces navegar se hace preciso
en barcos que se estrellen en la nada
vivir atormentado de sentido
creo que ésta, sí, es la parte mas pesada

en tiempos donde nadie escucha a nadie
en tiempos donde todos contra todos
en tiempos egístas y mezquinos
en tiempos donde siempre estamos solos
habrá que declararse incompetente
en todas las materias de mercado
habrá que declararse un inocente
o habrá que ser abyecto y desalmado
yo ya no pertenezco a ningún istmo
me considero vivo y enterrado
yo puse las canciones en tu walkman
el tiempo a mi me puso en otro lado
tendré que hacer lo que es y no debido
tendré que hacer el bien y hacer el daño
no olvides que el perdón es lo divino
y errar a veces suele ser humano

no es bueno hacerse de enemigos
que no estén a la altura del conflicto
que piensan que hacen una guerra
y se hacen pis encima como chicos
que rondan por siniestros ministerios
haciendo la parodia del artista
que todo lo que brilla en este mundo
tan sólo les da caspa y les da envidia
yo era un pibe triste y encantado
de Beatles, caña Legui y maravillas
los libros, las canciones y los pianos
el cine, las traiciones, los enigmas
mi padre, la cerveza, las pastillas los misterios el whiskymalo
los óleos, el amor, los escenarios
el hambre, el frío, el crimen, el dinero y mis 10 tías
me hicieron este hombre enreverado

si alguna vez me cruzas por la calle
regálame tu beso y no te aflijas
si ves que estoy pensando en otra cosa
no es nada malo, es que pasó una brisa
la brisa de la muerte enamorada
que ronda como un ángel asesino
mas no te asustes siempre se me pasa
es solo la intuición de mi destino

me gusta estar a un lado del camino
fumando el humo mientras todo pasa
me gusta regresarme del olvido
para acordarme en sueños de mi casa
del chico que jugaba a la pelota
del 49585
nadie nos prometió un jardín de rosas
hablamos del peligro de estar vivo
no vine a divertir a tu familia
mientras el mundo se cae a pedazos
me gusta estar al lado del camino
me gusta sentirte a mi lado
me gusta estar al lado del camino
dormirte cada noche entre mis brazos
al lado del camino
al lado del camino
al lado del camino
es mas entretenido y mas barato
al lado del camino
al lado del camino


"Al Lado Del Camino", by FITO PAEZ.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Simultaneidade


- Eu amo o mundo! Eu detesto o mundo!
Eu creio em Deus! Deus é um absurdo!
Eu vou me matar! Eu quero viver!

- Você é louco?

- Não, sou poeta.


MÁRIO QUINTANA, in "A Vaca e o Hipogrifo".

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Marcante


A estrada, o lugar e o mar.

O encontro, a voz e a fala.

A porta, o calor e o afago.

O beijo, a cama e o sexo.

O corpo, o êxtase e o carinho.

A contemplação, o sono e o sonho.

O não, a dúvida e o sim.

A tua presença em mim.


AMatzenbacher

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Acreditariam?!


V

Acreditariam
se eu disesse aos homens
que nascemos

tristemente humanos
e morremos flor?

Acreditariam
que a presença é ausente
quando o olhar se perde
nas alturas?

Acreditariam
ser a nossa vida
vontade consciente de não ser?

E ser luz e estrela
água, flor.

HILDA HILST, in "Balada de Alzira".

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

ano novo



"Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias,
a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão.
Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos.
Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez,
com outro número e outra vontade de acreditar
que daqui para diante vai ser diferente".

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE


PS: Ainda que já estejamos em fevereiro de 2011, desejo a todos blogueiros e blogueiras, leitores e leitoras, curiosos e curiosas, tímidos ou não, um FELIZ 2011!!!!!!!!! Abraços e beijos...