"Depois da guerra, pensava eu, restavam apenas cinzas, destroços sem íntimo. Tudo pesando, definitivo e sem reparo. Hoje sei que não é verdade. Onde restou o homem sobreviveu semente, sonho a engravidar o tempo. Esse sonho se ocultou no mais inacessível de nós, lá onde a violência não podia golpear, lá onde a barbárie não tinha acesso. Em todo este tempo, a guerra guardou, inteiras, as suas vozes. Quando se lhes impôs o silêncio elas mudaram de mundo. No escuro permaneceram lunares. Estas estórias [que ele vai contar no livro] falam desse território onde vamos refazendo e vamos molhando de esperança o rosto da chuva, água abensonhada. Desse território onde todo homem é igual, assim: fingindo que está, sonhando que vai, inventando que volta".
Mia Couto, in "Estórias Abesonhadas".
Na mais profunda e ardente cinza sempre existe uma chama de vida. O suficiente pra nos encher de esperança e servir de fertilizante pra uma nova realidade...
ResponderExcluirAdorei o texto!!!
E não nos conformando com o sonho desfeito, resistimos, paralisamos, chegamos a não desejar, até que finalmente encaramos o caminho de volta... somos realmente bons sonhadores e grandes inventores! Beijo, querido!
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